Caminhei no passeio, à beira rio, onde uma bicicleta rodava devagar sobre o poema "o Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia". As rodas giravam, no chão alcatroado, sobre uma palavra e outra, primeiro devagar e depois cada vez mais depressa, eu ouvia o som da roda girando sobre as palavras ainda legíveis, depois as letras começariam a deslizar e a confundir-se, até se converterem num borrão indistinto.
A escrita como imagem, o legível e o ilegível como verso e reverso de uma imagem num espelho, as palavras reflectidas ou projectadas sobre a água,
o asfalto do cais transformando-se em água, as palavras transformando-se em rio, as palavras "Pelo Tejo vai-se para o Mundo" ondulando sobre um rio, depois sem transição correndo sobre o mar, porque agora a água ondula, cavada, torna-se de um azul profundo, enquanto as letras brancas escurecem até ficarem negras, começam a desfazer-se na água e deixam de ser legíveis.
Tinha já prontas várias telas, trabalhava nas últimas duas.
Do projecto inicial ficariam apenas vestígios, no nome da exposição ("A cidade de Ulisses, Exposição de Paulo Vaz, a partir de um projecto de Cecília Branco"), e também o mote em que tínhamos pensado anos atrás:
"Os turistas fogem em geral de si mesmos e procuram, obviamente, as cidades reais. Os viajantes vão à procura de si, noutros lugares e preferem as cidades imaginadas. Com sorte conseguem encontrá-las. Ao menos uma vez na vida."
Teolinda Gersão
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