A tradição familiar me acompanha. Cedeu-me um repertório de acertos e desacertos. Uma bagagem que atualiza certos episódios, como os dois anos vividos em Borela, em comunhão com a natureza galega.
Na casa da avó, o mundo me exaltava. Sentia-me Atlas a reter a esfera da Terra em suas mãos. Enfrentava, destemida, a geografia adversa, enquanto aprendia o galego, o espanhol, os costumes locais, o substrato da grei de que me originara.
Aos poucos aprendia a respeitar as funções milenares das aldeias, a entender as peculiaridades inerentes ao camponês galego. Não me furtava a participar das ocorrências diárias, que já faziam parte da minha vida. Em especial da colheita do milho, que exigia celebração. Afinal, o milho salvava-os da fome, da inclemência do inverno.
Reunidos no pátio da casa da avó Isolina, desfolhávamos as espigas que seriam estocadas no belo hórreo, ou canastro, localizado atrás da casa.
O clima era festivo. Eu copiava a diligência com que eles retiravam a palha da espiga até ao sabugo, jogada dentro das cestas empilhadas à nossa frente. Dali a espiga iria para o canastro, construção hoje clássica do cenário galego.
O clima era festivo. Eu copiava a diligência com que eles retiravam a palha da espiga até ao sabugo, jogada dentro das cestas empilhadas à nossa frente. Dali a espiga iria para o canastro, construção hoje clássica do cenário galego.
O trabalho árduo só era interrompido para a merenda regada a vinho e a histórias fomentadas pelas intrigas. Na expectativa todos de surgir a qualquer momento a espiga vermelha alçada à categoria de relíquia. E isto porque quem a obtivesse ganhava o direito de cobrar um beijo de quem fosse. Um achado que propiciava festejar os sentidos, entoar canções com poemas de Rosalía de Castro e rubores no rosto, além de acanhamentos.
http://www.youtube.com/watch?v=6fmkJoWCcw8
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