No dia primeiro de Maio
neste país de prosa até aos dentes,
rodeado de palavras em tudo o que é papel
ou coisa transmissível
quem quis foi para a rua fazer o seu poema.
Não estava ali ninguém para discursos,
os artigos eram para limpar o cu.
As velhas queriam dançar - quem sabe -
pela última vez na sua vida.
As raparigas gritavam por aborto livre
e um homossexual levava uma criança ao colo
porque exigia creches no seu peito pintado.
No meio das grandes massas e palavras de ordem
a voz abafada do desejo erguia o seu poema,
transgredia...
Cada um escrevia ali o seu poema
entre os fulgores de um Maio
erguido a custo
nas mais finas agulhas.
Cada um deixava o seu sangue crescer
na mão do outro.
Mar, mar tenebroso e de repente calmo
na espuma de um sorriso,
na palma aberta ao rosto imediato.
Toda a cidade, agora feita de água,
brilhava e anoitecia nas gargantas.
Era um poema longo, longo
o que ela respirava.
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