Se eu transformasse os simples vegetais,
À luz do Sol, o intenso colorista,
Num ser humano que se mova e exista
Cheio de belas proporções carnais?!
E eu recompunha, por anatomia,
Um novo corpo orgânico aos bocados.
Achava os tons e as formas. Descobria
Uma cabeça numa melancia,
E nuns repolhos seios injectados.
As azeitonas, que nos dão o azeite,
Negras e unidas, entre verdes folhos,
São tranças dum cabelo que se ajeite;
E os nabos - ossos nus, da cor do leite,
E os cachos de uvas - os rosários de olhos.
Há colos, ombros, bocas, um semblante
Nas posições de certos frutos. E entre
As hortaliças, túmido, fragrante,
Como dalguém que tudo aquilo jante,
Surge um melão que me lembrou um ventre.
(extracto de Num Bairro Moderno)
Poema de Cesário Verde (1855-1886)
Fotografias de Edward Weston (1886-1958)
https://www.youtube.com/watch?v=eFd5h0JRdKg
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