sábado, 3 de novembro de 2012

Excertos de "Os Teclados"



Ela procurava alguma coisa que não era da ordem das palavras, embora só pudesse transmiti-la em palavras, algo talvez comparável à música embora não equivalente. Ondas de energia,  que se organizavam numa determinada estrutura – sim, talvez se pudessem pôr as coisas nesses termos, não sabia ao certo.

Havia como na música uma liberdade e  um determinismo – a última frase de um romance, por exemplo, estava já contida na primeira. Era sempre o tom que decidia tudo. Uma vez encontrado, tornava-se uma chave. Uma clave. Nos verdadeiros romances o essencial era, até certo ponto, previsível.

A questão era sempre a mesma, repetia a mulher. Não  importava o que se tinha pela frente, o teclado, o mundo, o Minotauro ou a esfinge. Algumas pessoas eram feitas para desvendar enigmas, passariam a  vida a tentar. O que seria mais suportável se pudessem fazê-lo também em nome dos outros, porque então não estariam sós, a tarefa seria colectiva. Se as pessoas formassem uma comunidade.

Era tudo uma ilusão, pensou. O mundo talvez não fosse um cosmos, um universo ordenado. Provavelmente não tinha medida, nem escapava ao caos.
(Ela caindo dos mundos, de esfera em esfera, presa por um pé. Descendo vertiginosamente através dos planetas. Em cada um uma sereia olhando.)
Ela também não tinha medida nem fronteira. Estava presa à existência, mas não fixada nela.

Cada um estava só, pensou. Não havia respostas em nenhum lugar. Nem havia mestres, porque também não havia verdades, nem caminhos.  Cada um tinha o seu próprio caminho. Embora às vezes, fugazmente, as pessoas se cruzassem – e esse era um instante fulgurante, como se uma luz se acendesse.

Um comentário:

  1. Boa tarde D. Helena, surpresa...estou de volta. E tenho estado igualmente de volta dos seus trechos, sempre galante e rigorosamente escolhidos, denunciando paixoes diversas. Hoje nao ha comentario, para o fazer preciso de tempo e ideias para rascunhar, apenas este bem-haja pela continuidade do seu blog aliado a condiçao mais que perfeita de super Avo.
    Beijinho, Hilda

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