domingo, 18 de novembro de 2012

(O) terramoto da poesia


Se, face à morte iminente, um samurai tivesse o sangue frio e o destemor para criar uns versos, não deveria morrer. Os samurais poupavam a vida do inimigo se este, quando a lâmina adversária se preparava para o derradeiro golpe, criasse um poema. Masamitsu Ito tornou-se então conhecido como o "samurai invulnerável". Era um espadachim medíocre, mas um poeta impetuoso. Perdia batalhas, mas não perdia a vida, escapando ileso pelas suas derrotas. Aos poucos foi-se dedicando totalmente à poesia, desprezando o manejo da espada, pois os haikus, literalmente, salvavam-lhe a vida. Em 31 de Dezembro de 1703, durante um cerco a Edo, Masamitsu Ito, que fazia parte do exército atacante, viu uma criança a largar um crisântemo que foi levado pelo vento. De imediato, veio-lhe à boca um haiku, que gritou para os soldados, para lhes dar ânimo:
Ao tocar no monte Fuji
A flor ao vento
Fê-lo tremer de cócegas
A terra, nesse instante, tremeu realmente, num dos maiores terramotos da história do Japão. A muralha de Edo caiu e tudo aquilo parecia ser fruto de um poema. Masamitsu Ito tornou-se a maior lenda do Japão, o mais terrível dos guerrreiros. Continuou, pelo resto da vida, um espadachim incapaz, mas com a couraça mais impenetrável de todas: um haiku.

Afonso Cruz
https://www.youtube.com/watch?v=FCwlT5qwP7g

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