As mães são jovens e belas, têm cabelos
brilhantes e um corpo flexível e perfeito, de cintura fina e ventre liso
Madalena
que depois vai crescer e ficar inchado e
redondo, elas caminharão alegres e triunfantes como se empurrassem o mundo à
sua frente,
Marta
caminharão com pernas ágeis que depois se
afastam um pouco ao andar e ficam inchadas do peso que carregam, mas elas não
se importam de se sentir desastradas e disformes, estão alegres e orgulhosas,
como se trouxessem dentro uma estrela.
Madalena
São dias felizes, porque são dias de
espera, chamamos a esse tempo estar de esperanças.
Eduardo
Tudo acontece porque elas disseram sim.
Podiam ter dito não, mas disseram sim
Hugo
e então começamos a nascer por dentro delas,
pelos meses adiante, pouco importa se é verão ou inverno, primavera ou outono,
crescemos suavemente, enrodilhados, até preencher todo o lugar que havia no seu
corpo,
Joana
e quando se tornar pequeno e deixarmos de
caber nele somos empurrados para exterior, através de uma passagem estreita,
onde mal cabia a nossa cabeça, somos forçados a sair pelo meio das suas pernas
afastadas e cá fora fazia frio e era desconfortável, e por isso gritámos,
enquanto o ar nos enchia a boca e os pulmões, e nos sentimos sufocados de
repente.
Madalena
E depois estávamos de novo sobre um
território familiar, um ventre, agora experimentado do lado de fora, e tínhamos
de respirar para estar vivos, sentíamos frio, náusea, desconforto, estranheza,
anestesiados no entanto pelo sono, porque felizmente dormíamos quase sempre,
excepto quando uma sensação dolorosa nos abria a boca num grito, começávamos a
conhecer a dor, embora ela não tivesse nome, todo o corpo se contraía em
carência, mas no momento do desespero encontrávamos o seio que procurávamos, o
mundo estava lá, à medida do nosso desejo e da nossa fome.
Marta
E assim as mães vivem connosco e através
de nós o processo de nascer, o momento brutal e deslumbrante que rebenta o seu
corpo e o mundo em que viviam antes, e as torna, e ao mundo, noutra coisa
diferente.
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