O Barco Moliceiro é, mais do que uma embarcação tradicional, um dos principais elementos da identidade cultural da Região de Aveiro, com uma história rica e que está profundamente enraizada na tradição local.
Quem visita a Ria de Aveiro, certamente, não ficará indiferente ao humor dos seus painéis e à sua estrutura, completamente diferente dos outros barcos que aqui navegam. Conhecer a história do Barco Moliceiro e o seu processo de construção é entrar no mais íntimo da cultura aveirense.
O Barco Moliceiro é uma embarcação tradicional que apenas existe e navega na Ria de Aveiro, tendo sido criada, de raiz, pelos mestres construtores navais da região, no século XIX. Na época, a apanha do moliço na Ria de Aveiro – que servia como fertilizante dos terrenos agrícolas – era uma das atividades económicas que mais se desenvolvia e tornou-se necessário criar um barco que facilitasse este trabalho.
Foi neste contexto que os construtores navais da região construíram de raiz uma nova embarcação – a que deram de Moliceiro – que com várias adaptações na sua estrutura, facilitava o trabalho a bordo e permitia às pessoas dormirem na proa do barco – porque era frequente os trabalhadores não virem a casa durante vários dias. Além disso, o Moliceiro foi construído com um fundo pouco profundo, pois assim era garantido que o barco navegasse na Ria de Aveiro sem encalhar, uma vez que as suas águas são pouco profundas.
O sucesso da nova embarcação foi tal que diariamente a Ria de Aveiro começou a ser navegada por centenas de Barcos Moliceiros, tendo a Apanha do Moliço se tornado uma das principais atividades empregadoras das pessoas da região.
Com a evolução dos processos agrícolas, as pessoas começaram a abandonar a apanha do moliço na Ria de Aveiro e procuraram outros empregos (ou emigraram), porém o Barco Moliceiro já era um símbolo da região e, mesmo já não sendo necessário para a apanha do moliço, continuou a ser construído pelos mestres da região.
Hoje, é uma das principais atrações turísticas da Região de Aveiro. Mas há muito mais a descobrir. Não se fique pelos passeios de barco!
Este lindo barco serve para tudo (...) é o encanto da ria. Tem não sei quê de ave e de composição de teatro. Anima a paisagem(...) chega a servir de casa (...) Não conheço outro mais artístico, mais leve, mais adequado às funções que exerce e à paisagem que o circunda.
Raúl Brandão, 1923, in “Os Pescadores"
A Arte da Carpintaria Naval do Barco Moliceiro candidatou-se a Património Mundial da UNESCO.
Após a inscrição no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial, em 2022, a Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro – entidade responsável pelo processo – entregou, em março de 2023, a candidatura “Barco Moliceiro: Arte da Carpintaria Naval da Região de Aveiro” à Lista do Património Cultural Imaterial da Humanidade que Necessita de Salvaguarda Urgente – UNESCO.
AVEIRO
Campos de Aveiro
Manchas de arroz,
E a vela de um barco moliceiro
Que um pirata ali pôs.
A servir de moldura,
O velho mar cansado;
E um Céu alto e a ter fundura
Na quilha reluzente de um arado.
Miguel Torga
MOLICEIRO DESLIZANDO AO LONGO
DAS SALINAS
(uma ria à janela)
Henri Matisse
Sempre abri a janela para o mar.
A ria levava-me e trazia-me a casa
ao anoitecer. A cidade passeava
pela avenida que ondulava de gente
em gente, mas a laguna era a cidade
branca com casinhotas e trilhos no meio
do nada: a cidade que eu queria ser quando
queria ser moliceiro e amarelo pintado,
petisco de fogareiro, nome na madeira
a caminho da barra. Vivi perto de mim
nas avenidas do mar. Fui espuma de uma onda
que rebentou em letras e remo contra e a favor
do vento. Ainda hoje abro as janelas do mar.
Ainda me escondo no branco fundo das salinas,
mas o marulhar das águas traz à tona
palavras que sobem sem mim, e eu só
uma mão ao leme à procura do norte para
me perder nos seus cristais docemente salgados.
Rosa Alice Branco
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