Estava um dia esplêndido com um céu azul espectacular e uma brisa limpa e fresca que cheirava a Outono e a mar. A minha Barcelona favorita foi sempre a de Outubro, quando a alma lhe sai a passear e a pessoa se torna mais sábia só de beber da fonte de Canaletas, que durante esses dias, por puro milagre não sabe nem a cloro. Avançava a passo ligeiro, evitando engraxadores, mangas-de-alpaca que voltavam do cafezinho de meio da manhã, cauteleiros e um bailado de varredores que pareciam estar a polir a cidade a pincel, sem pressa e com traço pontilhista. Já nessa época, Barcelona começava a encher-se de automóveis, e por alturas do semáforo da Rua Balmes observei postadas em ambos os passeios quadrigas de empregados de escritório de gabardina cinzenta e olhar esfomeado, a comer um Studebaker com os olhos como se se tratasse de uma cançonetista em roupão de quarto. Subi pela Balmes até à Gran Vía, vendo-me e desejando-me com semáforos, eléctricos, automóveis e até motocicletas com sidecar. Numa montra vi um cartaz da casa Phillips que anunciava a chegada de um novo messias, a televisão, que se dizia que ia mudar a nossa vida e nos ia transformar a todos em seres do futuro, como os americanos.
Carlos Ruiz Zafón
http://www.youtube.com/watch?v=MsB4a--WRTs