domingo, 30 de julho de 2023

Corticeiros

https://www.youtube.com/watch?v=a7xyEYEQR9o


No silêncio ardente do dia parado,

Há lida de gente no denso montado.

Há troncos despidos, já lívidos, frios,

E troncos que esperam, em funda ansiedade,

Com gestos convulsos, de sonhos sombrios,

Em dor e silêncio, por toda a herdade.

 

Os pés descalços trepam ágeis,

Sobem…

O machadinho crava-se e segura,

Como se fora um croque de abordagem,

O homem

A subir, na faina dura.

 

E há pasmo na canícula.

E há silêncio, de assombro, na paisagem!

 

– Troncos dilacerados!…

 

E lembra-me, assim vistos a distância,

– Os vultos a trepar pelos troncos gigantes –

Como, em contos de infância,

Cornacas dominavam enormes elefantes.

 

– Que troncos majestosos e inermes

Têm o ar daqueles paquidermes,

Lentos, laboriosos, resignados. –

 

Desses trágicos braços contorcidos,

Que mais tarde, a sangrar,

São a gala maior desta paisagem,

E, agora, estão gelados, confrangidos

Pela tortura sem par,

No pino da estiagem,

Vão homens rudes, escuros e suados,

Lenço metido sob o chapéu largo,

Arrancando aos bocados,

Em ferra luta obscura,

Com qualquer coisa de febril e amargo,

A epiderme dura.

 

– Oh, velhas árvores dos montados!.

 

Francisco Bugalho(1905-1949)

Pintura de Dórdio Gomes


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