quinta-feira, 11 de setembro de 2025

Os justiçados de Aveiro



No dia 16 de Maio de 1828, também apelidado de Dia dos Mártires da Liberdade, um grupo de homens da facção liberal, revoltado com o governo absolutista de D. Miguel, partiu de Aveiro em direcção ao Porto, onde com o apoio de muitos portuenses, deram início à Revolução de 1828. A repressão exercida pelos miguelistas resultou na condenação à pena de morte dos aveirenses responsáveis pelo movimento.
Seguiu-se  um período de grande instabilidade que se prolongou numa guerra civil. Em 1834, a vitória dos liberais põe fim ao conflito que opunha D. Pedro a seu irmão D. Miguel, o qual foi obrigado a seguir para o exílio na Alemanha.



CONFERÊNCIA DE JAIME CORTESÃO, 1956
Vejamos rapidamente como se passaram os factos. Falecido D. João VI, em 1826, passado mês e meio, D. Pedro, então Imperador do Brasil, renunciou à coroa de Portugal na pessoa de sua filha D. Maria da Glória e outorgou uma carta constitucional a Portugal na intenção de nomear regente seu irmão D. Miguel, que casaria com a princesa D. Maria desde que jurasse a Carta. Estava D. Miguel em Viena de Áustria, jurou a Carta, não obstante já então a conspirar contra as intenções de seu irmão. Passado pouco tempo, celebrava os esponsais com sua sobrinha, que era representada pelo Barão de Vila Seca. No ano seguinte veio para Portugal. Reunidas as Câmaras no Palácio da Ajuda, que ele elegera para sua residência, jurou novamente e solenemente, perante as Câmaras, fidelidade à Carta, declarando, palavras textuais, que reconhecia a legitimidade de D. Pedro IV e de sua sobrinha D. Maria como soberanos legítimos de Portugal. Não obstante, passados poucos dias deste juramento solene e público, ele começava a trair a sua palavra e, imediatamente, tratou de deitar por todos os meios mão do Poder. Demitiu da administração pública todas as pessoas que ocupavam lugares importantes, que fez substituir, transferiu oficiais, nomeou novos comandantes para os corpos, instaurou a censura, aumentou em quantidade enorme a polícia e, também imediatamente, inaugurou um sistema de repressão, o mais violento de que há memória na História de Portugal, contra os seus inimigos políticos.


D. Pedro defendia o liberalismo e seu irmão, D. Miguel, o absolutismo.

 
A reacção mais brutal, repito, que jamais se desencadeou em Portugal, acirrada pelos sermões de maus padres e maus frades desencadeou-se sobre os liberais, em primeiro lugar, de maneira oficial. A célebre Alçada do Porto começou a julgar os homens que tinham entrado na revolução. Foram muitos condenados à morte e a 7 de Maio de 1829 foram justiçados os dez primeiros, pouco depois mais alguns.
Rezavam as sentenças que esses homens, cujo crime era de ter ideias próprias políticas contrárias ao Governo absolutista e ter lutado por elas, esses homens perderiam todos os direitos, honras e privilégios, seriam levados pela cidade com baraços e pregão e depois conduzidos à forca onde seriam enforcados para depois lhes cortarem a cabeça e as cabeças serem espetadas num tronco nos lugares onde havia sido praticado o delito.
Dessas cabeças couberam seis ao distrito de Aveiro.
Não parou por aqui o horror. As cabeças desses homens foram levadas quatro para Aveiro, duas para a Feira e uma para Albergaria-a-Velha. Em Aveiro, quiseram alguns miguelistas que a cabeça de João de Morais Sarmento fosse espetada num pinheiro em frente da casa onde morava sua mãe. Houve alguns legitimistas que guardavam ainda um pedaço de humanidade no coração que se opuseram a isso.
As lojas, as casas na cidade, tinham fechado. Foi preciso ir buscar carpinteiros à força para preparar os madeiros onde se havia de espetar as cabeças. 
Não parou por aqui o suplício dos Liberais que ficaram em Portugal. Eram perseguidos a cacete nas ruas, eram levados para a prisão, na prisão violentados de toda a forma e havia sempre um padre ou um frade incitando, pedindo que os liberais fossem levados para a forca.

Jaime Cortesão, 1956



Monumento aos Mártires da Liberdade/Monumento aos Justiçados

Localização: Cemitério Central de Aveiro.
Data de colocação: 20 de Fevereiro de 1866.


Numa das faces do monumento está inscrito o nome dos justiçados de Aveiro:

7 de MAIO de 1829
Francisco Manoel Gravito da Veiga e Lima.
Manoel Luiz Nogueira.
Clemente de Mello // Soares de Freitas.
Francisco Silvério da Carvalho // de Magalhães Serrão.
9 do OUTUBRO de 1829
Clemente Moraes Sarmento.
João Henriques Ferreira.

A presença de alguns destes nomes na toponímia da cidade mostra o reconhecimento dos aveirenses e a importância de perpetuar a memória dos seus heróis.