domingo, 30 de dezembro de 2012

Árvores


O que tentam dizer as árvores
no seu silêncio lento e nos seus vagos rumores,
o sentido que têm no lugar onde estão,
a reverência, a ressonância, a transparência
e os acentos claros e sombrios de uma frase aérea.
E as sombras e as folhas são a inocência de uma ideia
que entre a água e o espaço se tornou uma leve integridade.
Sob o mágico sopro da luz são barcos transparentes.
Não sei se é o ar se é o sangue que brota dos seus ramos.
Ouço a espuma finíssima das suas gargantas verdes.
Não estou, nunca estarei longe desta água pura
e destas lâmpadas antigas de obscuras ilhas.
Que pura serenidade da memória, que horizontes
em torno do poço silencioso! É um canto num sono
e o vento e a luz são o hálito de uma criança
que sobre um ramo de árvore abraça o mundo.

António Ramos Rosa
http://www.youtube.com/watch?v=xk3KMv7F-N0&playnext=1&list=PLYmwFR_XLSpbu2kgRCpPyFp1oam9OOBmE&feature=results_video

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Loa


                         É nesta mesma lareira,
                         E aquecido ao mesmo lume,
                         Que confesso a minha inveja
                         De mortal
                         Sem remissão         
                         Por esse dom natural,              l,
                         Ou divina condição,
                         De renascer cada ano,
                         Nu, inocente e humano
                         Como a fé te imaginou,
                         Menino Jesus igual
                         Ao do Natal
                         Que passou.

                         Miguel Torga
                         http://www.youtube.com/watch?v=dxf7dIUiP4w

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Eu sou do tamanho do que vejo


Da minha aldeia veio quanto da terra se pode ver no Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não, do tamanho da minha altura...
Nas cidades a vida é mais pequena
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro.

Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave,
Escondem o horizonte, empurram o nosso olhar para longe de todo o céu,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos nos podem dar,
E tornam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver.


Fernando Pessoa
https://www.youtube.com/watch?v=1t2G1HGyz-8

domingo, 9 de dezembro de 2012

Finisterra


O Cristo de Finisterra apareceu na praia de Cabanas onde o mar o deixou com muita mansidão e quando pode e lho pedem com devoção ajuda os marinheiros na sua luta contra as ondas e outros perigos, Santo Cristo de Finisterra, santo de barba dourada, ajuda-me a subir a laje de Touriñana, a sua barba dourada agora está preta, reconhece-se que o tempo a enegreceu, o tempo e os desgostos enegrecem tudo que tocam, o Cristo meteu os mouros na cintura quando eles se sublevaram e o quiseram ofender, os piratas berberescos numa descoberta que fizeram por aqui na segunda metade do século XVII mofaram dele, um quis deitá-lo abaixo com um golpe de cimitarra mas o Cristo olhou-o fixamente, deixou-o imóvel como uma estátua e deu-lhe uma amaricada e humilhante voz de flauta, os mouros arrependeram-se da sua atitude e o Cristo deixou-os partir, diz a tradição que se converteram ao cristianismo e se baptizaram na vila de Cee, desde então aos de Finisterra chamam mouros pelo contorno, os de Noia são bêbados, os de Muros são desajeitados, os de Finisterra  são mouros e os de O Son são bucheiros, o Cristo de Finistera tem fama de brigão, não se sabe se justa ou injustamente, e de andar aos tiros quando se confronta, o Cristo de Finisterra tem uma pistola de ouro, e tem de ser de ouro tendo em conta que aos de Muros mata-os no monte Louro, pode ser que dona Onofre cometa os seus pecados como toda a gente, os seus pecados de carne, para isso fez Deus a carne pecadora, a dor de coração e o propósito da emenda, etc.
 

domingo, 2 de dezembro de 2012

Colegas


Encontrar os colegas de curso, 16 ou 17 anos depois,  e ver como de comum temos o estarmos todos mais gordos e lembrarmo-nos embaraçadamente de quem éramos. O passado, embora deixando saudades, parece ser sempre uma vergonha qualquer, e viver é engordar.
Pensei logo que não devia ter aparecido com a roupa da tarde. Devia ter ido a casa, tomar um segundo banho, fazer outra vez a barba, vestir a camisa que comprei no estrangeiro, fazer de conta que visto sempre assim, casual, sem dar importância. Parecer ainda mais bonito. Devo ser o único mais bonito do que era aos 20 anos. Não por algum milagre. Apenas porque aos 20 anos eu assustava um morto. Tinha só ossos e cabelo despenteado, estio, azeiteiro. Era um bicharoco de olhos vesgos e grandes, atrás de óculos dourados com tamanho de pneus. Claro que hoje, charmoso, estou muito melhor. Isso é raro acontecer com as pessoas. Talvez apenas o engenheiro Álvaro, como eu, tenha ficado favorecido. Durante horas olhei e convenci-me de era uma presença muito avulsa no jantar, sem referência. No fim, caramba, a revelação. Muito estranho. Está mais novo. Deve comer com juízo e deve estar feliz.
Acho que procuramos os sinais da felicidade quando reencontramos alguém depois de uma longa separação. A possibilidade de ter corrido tanta coisa mal é muita, e a expectativa de saber se cada um de nós escapou à atrocidade é grande. Nunca escapamos inteiramente à atrocidade. Temos sempre as nossas mazelas que, num jantar assim, procuramos esconder com um segundo banho, a barba outra vez e a camisa do estrangeiro. Deve ser isso a que se chama festa, ou então pode ser mesmo uma borracha sobre o passado. Um banho e uma camisa para apagar o passado.
Há qualquer coisa nos tempos de escola que nos revela para sempre. Hoje, uns advogados, outros funcionários nem sei de quê, procuradores, juízes ou escritores, somos sempre um certo regresso à simplicidade de tempos idos, como se fosse impossível criar uma distância demasiada em relação à memória guardada. Serei sempre, creio, o cachopo melómano, meio rockeiro e embasbacado dos meus 20 anos. É um pouco como voltar a casa, estar em família. Fica-se a mesma criatura desmascarada do costume. Isso, sem dúvida, é o melhor.
Nunca voltaria a estudar Direito. Mas não me importaria de repetir os colegas. Sobretudo se pudermos contar com a lealdade de o empertigado da vida de hoje não nos retirar a cumplicidade da vida de então. Se isso se perder, prefiro não voltar a jantar assim. E não desperdiço sequer a minha camisa estrangeira.
 

sábado, 24 de novembro de 2012

"He loved beauty that looked kind of destroyed"


Gostava dessa espécie de beleza
que podemos surpreender a cada passo,
desvelada pelo acaso numa esquina
de arrabalde; a beleza de uma casa devoluta
que foi toda a infância de alguém,
com visitas ao domingo e tardes no quintal
depois da escola; a beleza crepuscular
de alguns rostos num retrato de família
a preto e branco, ou a de certos hotéis
que conheceram há muito os seus dias de fulgor
e foram perdendo estrelas; a beleza condenada
que nos toma de repente, como um verso
ou o desejo, como um copo que se parte
e dispersa no soalho a frágil luz de um instante.
Gostava de tudo isso que deixava muito a sós
consigo mesmo, essa espécie de beleza arruinada
onde a vida encontra o espelho mais fiel.

Rui Pires Cabral
https://www.youtube.com/watch?v=JRXqjxUCuMw

domingo, 18 de novembro de 2012

(O) terramoto da poesia


Se, face à morte iminente, um samurai tivesse o sangue frio e o destemor para criar uns versos, não deveria morrer. Os samurais poupavam a vida do inimigo se este, quando a lâmina adversária se preparava para o derradeiro golpe, criasse um poema. Masamitsu Ito tornou-se então conhecido como o "samurai invulnerável". Era um espadachim medíocre, mas um poeta impetuoso. Perdia batalhas, mas não perdia a vida, escapando ileso pelas suas derrotas. Aos poucos foi-se dedicando totalmente à poesia, desprezando o manejo da espada, pois os haikus, literalmente, salvavam-lhe a vida. Em 31 de Dezembro de 1703, durante um cerco a Edo, Masamitsu Ito, que fazia parte do exército atacante, viu uma criança a largar um crisântemo que foi levado pelo vento. De imediato, veio-lhe à boca um haiku, que gritou para os soldados, para lhes dar ânimo:
Ao tocar no monte Fuji
A flor ao vento
Fê-lo tremer de cócegas
A terra, nesse instante, tremeu realmente, num dos maiores terramotos da história do Japão. A muralha de Edo caiu e tudo aquilo parecia ser fruto de um poema. Masamitsu Ito tornou-se a maior lenda do Japão, o mais terrível dos guerrreiros. Continuou, pelo resto da vida, um espadachim incapaz, mas com a couraça mais impenetrável de todas: um haiku.

Afonso Cruz
https://www.youtube.com/watch?v=FCwlT5qwP7g

sábado, 10 de novembro de 2012

(à Ana no dia dos anos)


Havia uma flor!
Nem eu sabia
onde é que a flor havia,
mas tanto fazia.

Talvez houvesse
onde ninguém soubesse
ou fosse uma flor de estar a haver
só na minha imaginação,
ou não fosse uma flor, fosse uma canção.

Nem a flor sabia
que existia.
Em qualquer sítio, sem saber, floria.
E se fosse uma canção cantava e não se ouvia.

E isso acontecia
no meu coração.
Não sei se era uma flor se uma melodia,
era qualquer coisa que havia,
e cantava e floria,
dentro de mim sem razão.

Ia pela rua e ninguém diria.
As  pessoas passavam
e eu dizia:
"Bom dia!"
E ninguém suspeitava
o bom dia que fazia
em qualquer sítio
que dentro de mim havia!
Só  eu sabia e sorria,
levando-te pela mão.

Manuel António Pina
http://www.youtube.com/watch?v=YUJ7cDSuS1U

sábado, 3 de novembro de 2012

Excertos de "Os Teclados"



Ela procurava alguma coisa que não era da ordem das palavras, embora só pudesse transmiti-la em palavras, algo talvez comparável à música embora não equivalente. Ondas de energia,  que se organizavam numa determinada estrutura – sim, talvez se pudessem pôr as coisas nesses termos, não sabia ao certo.

Havia como na música uma liberdade e  um determinismo – a última frase de um romance, por exemplo, estava já contida na primeira. Era sempre o tom que decidia tudo. Uma vez encontrado, tornava-se uma chave. Uma clave. Nos verdadeiros romances o essencial era, até certo ponto, previsível.

A questão era sempre a mesma, repetia a mulher. Não  importava o que se tinha pela frente, o teclado, o mundo, o Minotauro ou a esfinge. Algumas pessoas eram feitas para desvendar enigmas, passariam a  vida a tentar. O que seria mais suportável se pudessem fazê-lo também em nome dos outros, porque então não estariam sós, a tarefa seria colectiva. Se as pessoas formassem uma comunidade.

Era tudo uma ilusão, pensou. O mundo talvez não fosse um cosmos, um universo ordenado. Provavelmente não tinha medida, nem escapava ao caos.
(Ela caindo dos mundos, de esfera em esfera, presa por um pé. Descendo vertiginosamente através dos planetas. Em cada um uma sereia olhando.)
Ela também não tinha medida nem fronteira. Estava presa à existência, mas não fixada nela.

Cada um estava só, pensou. Não havia respostas em nenhum lugar. Nem havia mestres, porque também não havia verdades, nem caminhos.  Cada um tinha o seu próprio caminho. Embora às vezes, fugazmente, as pessoas se cruzassem – e esse era um instante fulgurante, como se uma luz se acendesse.

sábado, 27 de outubro de 2012

!


 A Praia das Maçãs de novo, a casa dos meus pais de novo. Todos os anos prometo a mim mesmo
   - Foi o último
   e ignoro, sinceramente, o que me faz voltar. Saudades de quê? Nunca me senti especialmente feliz aqui, as pessoas das famílias com quem a minha família se dava não me interessam, estou a escrever um livro e passo os dias no quarto, à noite a neblina desbota para  dentro de mim e entristece-me: o que me fará voltar? Os meus irmãos, de quem gosto muito, a luz, de quem gosto também, e não é isso, meu Deus, não é isso. A minha infância? O menino que deixei de ser tornou-se um antepassado e em certa medida uma criatura enigmática, distante, da qual sou filho ou neto, da qual conservo uns traços: o orgulho, a paciência, a solidão. O sorriso, talvez. Já em criança se me afigurava  esquisito haver nascido dos meus pais: herdei pouca coisa deles, acho eu, qualidades, defeitos, parecenças físicas. A violenta insegurança do meu pai e a secura da minha mãe impacientavam-me: tive de me construir sozinho, não contra eles mas de costas para eles, e julgo que isso foi bom: tornou-me livre. Estou-lhes grato por não me terem dado nada a não ser a matéria de que me modelei. Pensando melhor acho que herdei a austeridade, o desprendimento. Não me é difícil ir embora, a qualquer momento, seja para onde for, sem necessitar de mala. O  que preciso cabe, literalmente, nos bolsos das calças(...)
   Mas não é disso que se trata aqui, é da Praia das Maçãs e de mim. Se me perguntassem
   - Gostas da Praia das Maçãs?
   hesitava. E no entanto, reparo, povoa os meus livros. Como Nelas, vila tão amada, a que regresso sempre  que posso. Se gosto da Praia das Maçãs? Não tenho nada em comum com as criaturas que aqui veraneiam, nem as cumprimento sequer
   (- O António é tão malcriado)
    porque não as vejo e, se as visse, não teria paciência, vejo os pinheiros, o mar
   (para esses tenho paciência)
   os da terra que me conhecem desde sempre
   (para esses tenho paciência)
   ando um bocado a pé, por aí, ao acaso, num intervalo do livro, passo pela casa da minha tia Bia como se ela não tivesse morrido, apetece-me entrar na sala, estarmos juntos, calados, diante da televisão apagada. Não a esqueci, tia, não a vou esquecer. Que mais? Na minha família não somos especialmente divertidos nem faladores, uma implacável discrição cobre o afecto, não se fazem perguntas pessoais, não se comenta a vida de ninguém. O que me fará voltar? Julgo que volto pelos meus irmãos. Por um certo melro no pinhal. Pelo cheiro das ondas. Pela tal criatura de que sou filho ou neto e a quem, a esse sim, devo o que sou. Para que o ar da praia lhe dê boas cores. Para reencontrar as suas aspirações confusas, a febre dos seus entusiasmos, as suas ingénuas certezas.

António Lobo Antunes
http://www.youtube.com/watch?v=4240QMQ1jhU

domingo, 21 de outubro de 2012

O resto é silêncio (que resto?)


                                       Volto, pois, a casa. Mas a casa,
                                       a existência, não são apenas coisas que li?
                                       E o que encontrarei
                                       se não o que deixo: palavras?

                                       Eu, isto é, palavras falando,
                                       e falando me perdendo
                                       entre estando e sendo.
                                       Alguma vez, quando

                                       havia começo
                                       e não inércia,
                                       quando era cedo
                                       e não parecia,

                                       as minhas palavras puderam estar
                                       onde sempre estiveram:
                                       no apavorado lugar
                                       onde sou o silêncio.

                                       Manuel António Pina
                                       http://www.youtube.com/watch?v=Xl71VPq6LiE
                                           

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Final de caminhada


Entrada em Covas do Monte cerca das três horas, o Sol queimava, e eles começaram a atravessar a aldeia devagar, caminham um a um espaçadamente, detêm-se a observar e a fotografar o mais ínfimo pormenor, o encaixe perfeito das placas de xisto nos telhados, a estrutura de uma janela, a simplicidade de uma ponte de madeira. Como peregrinos acabados de chegar ao seu destino, não tinham pressa e queriam apreciar exaustivamente tudo quanto os seus olhos captavam. Cabras, muitas cabras, ao longo das paredes, para se abrigarem do Sol. A certa altura havia um muro muito comprido à sombra do qual descansavam dezenas de cabras tranquilamente alinhadas. Uma imagem deveras insólita e inesperada a merecer muitas fotografias. Não longe dali a pastora vagueava com alguns animais, pois a maior parte já se refugiara nos abrigos. Tudo parecia tão irreal. O som das palavras é abafado, os gestos lentos, o ar pesa, a claridade atordoa. Mas para além de tudo isto ou por isso mesmo, sente-se em harmonia com a natureza e o espírito do lugar. E principalmente com ela própria. Um sentimento de mansidão e de profundo bem-estar predispunha à manifestação de comportamentos espontâneos e alegres.
 A aldeia tem poucos habitantes, são muitos os sinais de abandono, no entanto viram algumas pessoas, talvez se encontrassem de visita a familiares ou a passar férias na terra, numa zona que deve funcionar como centro da aldeia, à volta de uma fonte e não longe do inesperado restaurante já referido.
Na fonte, eles aproveitaram para se refrescarem, beber água, molhar braços, rosto e cabelos, repetindo gestos idênticos aos dos seus antepassados. O mundo real continuava muito longe dos seus pensamentos.
Em seguida entraram no restaurante que, como foi dito, está instalado na antiga escola primária, atravessaram a sala de jantar decorada com gosto, num estilo regional sóbrio e dirigiram-se para a zona do café/bar, um espaço que corresponde ao que era dantes o telheiro no recreio da escola, fechado de lado por um vidro, equipado com uma fila de  mesas rectangulares de madeira colocadas paralelamente umas às outras e bancos corridos em vez de cadeiras. Este mobiliário simples era o mais adequado possível às dimensões e aos traços da arquitectura original do  lugar.
Neste café, onde não faltavam os usuais refrigerantes e gelados, resolveram beber uma cerveja bem fresquinha. Um prazer redobrado, sobretudo porque tão improvável numa aldeia tão isolada, talvez uma maneira de festejar esta aventura com final muito feliz.

HN
http://www.youtube.com/watch?v=hcr3XhXdXfA

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Não Chove


Não chove ainda mas a terra
na sua amarelenta e fria cor
já cheira a chuva.
Não poderia viver onde a luz
fosse estrangeira. Teria medo
de morrer sem partilhar
com o sol do meio-dia
a pulsação do próprio olhar.
Não se pode mudar a luz
como quem muda de camisa:
o meu país
é onde a pedra acesa do mar
ilumina as veredas
do coração. E a cal
escorre dos muros e do tronco
das oliveiras. Até ao chão.

Eugénio de Andrade

domingo, 23 de setembro de 2012

Uma referência


Aos pássaros que gorjeiam prefiro os que grasnam
como os corvos ou os que piam na escuridão
como as vigilantes corujas brancas que infestam os meus bosques.
O canto melodioso amolece os corpos
e anestesia as almas que renunciam à reflexão e ao tormento
e temem o rumor do dia predatório.
Sempre desejei que o meu reino fosse o da dissonância:
do gavião que, pousado na estaca, rumina a sua impiedade,
dos pássaros grasnantes que incomodam os partidários de uma
                     regência musical do mundo 
como se estivéssemos num teatro, ouvindo uma sinfonia.
Ao gorjeio que conduz ao deleite e embala o sono
oponho o grasnido que semeia
a insônia e o desconforto.

Lêdo Ivo
http://www.youtube.com/watch?v=Myd1iezrYw0&feature=related

domingo, 16 de setembro de 2012

A importância de não ser de lado nenhum



Não sei se somos nós o povo dos navegadores. Creio que todos os que cresceram junto a um mar também o são: holandeses, polinésios, viquingues, Cook, Tasman, Sinbad. Também não sei por que somos nós o povo dos poetas. Os húngaros consideram-se um povo de poetas, os chineses também, os persas cultivam a poesia desde os tempos de Zaratrusta, os chilenos e os polacos têm prémios Nobel de poesia, para não falar nos italianos, dos franceses, dos irlandeses.
O bacalhau tão amigo dos nossos pobres, também o era dos genoveses, e dos catalães, quando eles eram pobres e emigravam para a Califórnia e para a Argentina. O veneziano Pietro Querini, no século XV, iniciou o comércio regular de bacalhau das ilhas Lofoten com o norte de Itália, e ainda hoje um dos pratos mais típicos de Veneza é o bacalhau amanteigado.
Não sei por que o nosso vinho é o melhor do mundo. Também o dos neo-zelandeses, o dos sul-coreanos e o dos alemães o é. Basta bebê-lo com a companhia certa e qualquer vinho, de qualquer preço é o melhor do mundo. a nossa gente é simpática e hospitaleira, mas é rude e iletrada. O clima é bom mas húmido, temperado mas instável, o sol aquece mas o mar aleija.
Viajando, tenho reparado que é transversal a tantas pessoas de tantas nacionalidades esta necessidade de se assegurarem da mesma coisa: que pertencem a uma nação especial. E pertencem, porque é a sua. Cesare Pavese escreveu um livro lindíssimo sobre tudo isto, sobre a necessidade de pertencer a algum lugar, uma dolorosa reflexão da importância de ter raízes. Que são como os parentes: não se escolhem, recebem-se.
O clima é instável, o mar gelado, a terra pobre, as cidades desfiguradas, a gente dura mas hospitaleira. O bacalhau cada vez mais caro, o vinho também. Mas é tudo o que tenho e o que espera por mim. Às vezes, sabe bem regressar. Outras, apetecia mesmo era ficar para sempre lá fora - mas nem vale a pena tentar.

domingo, 9 de setembro de 2012

Palomar na praia




Leitura de uma onda
O mar está levemente encrespado e pequenas ondas vêm bater na costa arenosa. O senhor Palomar encontra-se na praia, de pé, e observa uma onda. Não se pode dizer que esteja absorto na contemplação das ondas. Não está absorto, porque sabe muito bem aquilo que faz: pretende observar uma onda e observa-a. Não está contemplando, porque para a contemplação é necessário um temperamento adequado, um estado de espírito adequado e um conjunto de circunstâncias externas adequadas: e apesar do senhor Palomar não ter qualquer questão de princípio contra a contemplação, nenhuma destas três condições se verifica no seu caso. Finalmente, não são as "ondas" que ele pretende observar, mas uma única onda e basta: querendo as sensações vagas, estabelece para cada um dos seus actos um objectivo limitado e bem definido.
A crista da onda que avança levanta-se num ponto determinado, mais do que nos outros, e é ali que começa a franjar-se de branco. Se isso acontece a uma certa distância da costa, a espuma tem tempo de se enrolar sobre si própria e de desaparecer de novo, como que engolida, para no mesmo momento tornar a envolver tudo, mas desta vez despontando de baixo, como um tapete branco que trepa pela praia acima para acolher a onda que está para chegar. Mas, quando se espera que a onda role sobre o tapete, verifica-se que já não há onda, mas somente o tapete, e mesmo este desaparece rapidamente, tornando-se uma cintilação de areia molhada que se retira veloz, como se fosse empurrada pela areia enxuta e opaca que faz avançar o seu limite ondulado.
Tomando como modelo o desenho das ondas, a praia insinua na água algumas línguas de areia mal delineadas, que se prolongam em bancos submersos, daqueles que as marés fazem e desfazem em cada maré. Foi uma destas baixas línguas de areia que o senhor Palomar escolheu como ponto de observação, porque as ondas batem nela obliquamente de um lado e do outro, e ao cavalgarem a superfície semi-submersa encontram-se com as que chegam do outro lado.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

O Doiro


Começa em Miranda e acaba na Foz, este calvário. Começa em pedra e água, e acaba em pedra e água. Como nos pesadelos, não há nenhum intervalo para descansar. Entra-se e sai-se do transe em plena angústia.
No Portugal telúrico e fluvial não conheço outro drama assim, feito de carne e sangue. Drama cruciante e ciclópico, que é o embate de duas forças brutas no primeiro acto, um corpo-a-corpo de vida ou de morte no segundo, e uma espécie de triunfo da fatalidade no terceiro, com o pano do mar a cair.
Doiro, rio e região, é certamente a realidade mais séria que temos. Nenhum outro caudal nosso corre em leito mais duro, encontra obstáculos mais encarniçados, peleja mais arduamente em todo o caminho; nenhuma outra nesga de terra nossa possui mortórios tão vastos, tão estéreis e tão malditos. Basta sentir no corpo, uma só vez, a dentada daquelas fragas que devolvem ao céu, agressivamente, a luz recebida, ou molhar os pés na levada barrenta que o garrote dos espinhaços tenta estrangular, para se ver que não há desgraça maior dentro da pátria nem semelhante via-sacra de meditação. De ponta a ponta do ano nenhuma bênção possível mitiga a crucificação do sofrimento. No verão, um calor de forja caldeia o xisto e transforma a corrente numa alucinação de lava a mover-se; no inverno, até os olhos das videiras choram de frio. Beleza não falta em qualquer tempo, porque onde haja uma vela de barco e uma escadaria de Olimpo ela existe. Mas a própria beleza deve ser entendida. Não é subir aos restolhos de Lagoaça, contemprar o abismo, e quedar-se em êxtase. Não é espreitar de S. Salvador do Mundo o Cachão da Valeira, e sentir calafrios. Não é descer de Sabrosa para o Pinhão, estacar em S. Cristóvão, e abrir a boca de espanto. Não é ir a S. Leonardo de Galafura ou ao miradoiro  de S. Brás, olhar o caleidoscópio, e ficar maravilhado. É compreender toda a significação da tragédia.
Patético, o estreito território de angústia, cingido à sua artéria de irrigação, atravessa o país de lado a lado. E é, no mapa da pequenez que nos coube, a única evidência incomensurável com que podemos assombrar o mundo.

Miguel Torga
http://www.youtube.com/watch?v=D_LkoFn0JzI 

sábado, 28 de julho de 2012

Sinais de Fogo


No dia seguinte, tinha de procurar o José Ramos e a irmã. Encontrava-os na praia, eu sabia mais ou menos a altura em que os pais deles costumavam alugar barraca. A Mercedes era bonita, e distinguira-se, para mim, das amigas dela, com quem a gente, pela manhã, no banho, brincava de empurrá-las para a água, ou, à tarde, ficava deitado na areia, sob o olhar vigilante das mamãs, jogando entediadamente o prego que elas atiravam sabiamente, com muitas regras sucessivas. Passear com elas,  naquele tempo, era ainda impensável. O mais que elas faziam eram passearem à tarde pela esplanada, em grupos compactos, cujo número compensava a falta de vigilância das mães e das tias. Nós, em grupos, seguíamo-las, ou cruzávamos acintosamente por elas. Mesmo que um irmão de uma estivesse num grupo de rapazes, a aproximação não se dava. Pelo contrário: isso vincava ainda mais a distância. Quando no casino havia "bailes juvenis", elas iam, "devidamente acompanhadas", sem o que não entrariam. Esta severidade da gerência era muito louvada pelas famílias, nas conversas de praia, de barraca para barraca contígua. Sentadas em cadeirinhas baixas, e fazendo intermináveis "tricots", cujos pontos ensinavam umas às outras, as senhoras discutiam estas questões, e informavam-se discretamente de quem nós éramos, com vistas aos namoros das filhas. A perseguição feita a alguns, muito insidiosa, chegava a incluir irmãos e primos, ou, pelo menos, tentava conseguir que a amizade deles, por alguém "de condição ou de futuro", arrastasse a desejada vítima para o redondel das cadeirinhas. Daí que, cautelosamente, nós nunca caíssemos em jogar prego perto das barracas, mas nos toldos. Estes constituíam aliás, na sua formatura em filas perpendiculares à das barracas, uma espécie de proletariado olhado com desdém pela aristocracia barraquina. Todas as famílias que se prezavam alugavam barraca para a temporada. Meus tios, que nunca punham os pés na praia, também tinham a sua, o que me garantia certo "status" perante as senhoras. Os toldos eram para veraneantes sem categoria, que, por mais que fizessem sorrisos amáveis, não conseguiam arrancar às damas das barracas mais que um leve reconhecimento de cabeça.

Jorge de Sena
http://www.youtube.com/watch?v=Hz--o0ABNes

domingo, 22 de julho de 2012

Sugestão


Sede assim - qualquer coisa
serena, isenta, fiel.

Flor que se cumpre,
sem pergunta.

Onda que se esforça,
por exercício desinteressado.

Lua que envolve igualmente
os noivos abraçados
e os soldados já frios.

Também como este ar da noite:
sussurrante de silêncios,
cheio de nascimentos e pétalas.

Igual à pedra detida,
sustentando seu demorado destino.
E à nuvem, leve e bela,
vivendo de nunca chegar a ser.

À cigarra, queimando-se em música,
ao camelo que mastiga sua longa solidão,
ao pássaro que procura o fim do mundo,
ao boi que vai com inocência para a morte.

Sede assim qualquer coisa
serena, isenta, fiel.

Não como o resto dos homens.

Cecília Meireles
http://www.youtube.com/watch?v=dPJUCdhTSNQ

domingo, 15 de julho de 2012

Falajar


Assola o país uma pulsão coloquial que põe toda a gente em estado frenético de tagarelice, numa multiplicação ansiosa de duos, trios, ensembles, coros. Desde os píncaros de Castro Laboreiro ao Ilhéu de Monchique fervem rumorejos, conversas, vozeios, brados que abafam e escamoteiam a paciência de alguns, os vagares de muitos e o bom senso de todos. O falatório é causa de inúmeros despautérios, frouxas produtividades e más-criações.
Fala-se, fala-se, fala-se, em todos os sotaques, em todos os tons e decibéis, em todos os azimutes. O país fala, fala, desunha-se a falar, e pouco do que diz tem o menor interesse. O país não tem nada a dizer, a ensinar, a comunicar. O país quer é aturdir-se. E a tagarelice é o meio de aturdir-se mais à mão.
Falam os médicos, os notários, os empreiteiros, os varredores, os motoristas, os professores e toda a lista de profissões da estatística e não há corporação que fique de fora neste zunzunar do paleio, vendedores de automóveis, mediadores de seguros, sapateiros que passam a vida a cantar, empregados de mesa, agentes da autoridade, doentes dos hospitais, operadores imobiliários, empregados forenses, e também engenheiros, sem-abrigo, vagabundos, telefonistas, padeiros, patinadores, engraxadores e vândalos. Imigrantes provindos de países sombrios aprendem aqui a soltar as línguas, aderem ao velho ofício de dar à taramela, por isto e por aquilo, por tudo, nada. Passam-se dias, meses, anos, remoem as depressões, adejam os perigos e o país a falajar, falajar, falajar.

Mário de Carvalho
http://www.youtube.com/watch?v=PcHnZLLEB7s

domingo, 8 de julho de 2012

A Casa Grande de Romarigães


Em menos de cinco anos estava acabada a Casa Grande, prédio de torre, com largos salões e muitos cómodos, no flanco a capela de N.ª S.ª do Amparo, e uma cozinha de lajedo e chaminé de barretina, compreendendo lareira, armários, dois fornos em que se podia assar, ao estilo das comunidades conventuais, um boi no espeto. A fonte, perto do corgo, gorgolejava por uma bocarra, na sua carranca de Medusa, abundante e fresca água. E o bastio de pinheiros e carvalhiços cobria já o cerro em frente, unido à velha mata e populosa cidade dos pássaros. À tarde a brisa, que subia desde a costa pelo estuário do Coura, arrepiava-lhe brandamente as corutas e uma onda balsâmica e elísia varria a Casa Grande.
Os prados estavam a produzir em pleno rendimento, e ano por ano já não havia tonéis e cubas bastantes para a vinha de espaldeira e enforcado que guarnecia os contornos do regadio. De manhã a sol-pôr era ali uma alfândega de gente. Vinham os taverneiros de Cristelo e do Bico encher os seus odres, e os almocreves de Guimarães com vistosas rédeas de azémolas, ajoujadas de campainhas castelhanas, tirar cargas e cargas de milho. Manadas de vacas, de úberos retesos, mugindo amaviosas quando mamãs recentes, davam amenidade bíblica ao verde anojadiço das veigas. As ovelhas baliam nos rossios, e era patusco ver os poldros novos despedir em carreiras vertiginosas pelos cerros e estacar cerce como o cavalo de Fuas Roupinho nas arribas da Nazaré.
No Inverno abrigavam-se na propriedade as aves indígenas, rudes mas pouco aventureiras, como o gaio, o melro e o picanço. Certos bichos do monte, entre os quais a raposa, a fuinha, e o gato bravo, elegiam também a mata velha para sede das suas tocas e madrigueiras. De coelhos, os tojais eram um inçadoiro. Sol posto, investiam através das regadas de sanfeno até à horta, à beira mesmo da casa. Primeiro que ninguém haviam eles de provar a couve troncha e a folha da luzerna adstringente. Nas noites de luar nada mais engraçado que vê-los em corrimaças, devaneios e nas batalhas por sua dama ou seus caprichos, ora orelhas fitas, aptas a recolher os sussurros mais subtis, botando o seu trote e acaçapando-se, ora à desfilada, mandando mil pernas maratónicas. E quando avançavam aos saltinhos para as fêmeas, dando a sua sapatada a meter medo aos rivais, eram mais cómicos que cupidos a lançar a frecha.

Aquilino Ribeiro
http://www.youtube.com/watch?v=RAZNxlG-uNw

segunda-feira, 2 de julho de 2012

A árvore


A árvore ainda, para terminar; ergue-se no quintal da casa, como um templo, como um prédio de cimento armado; cresce; os ramos desenvolvem-se para cima, para os lados; depois de grandes, o peso tomba-os um pouco, lentamente para baixo; floresce; nascem as folhas brilhantes e sedosas, frágeis, puras, informes, como um raio de prata; criam nervuras que endurecem, tornam-se rudes e pesadas; dão frutos, sementes, sumos, cores, sabores, cheiros, saciedade; as flores sonham, adormecem, ficam velhas e instáveis; tombam; e movem-se; e morrem; caem as folhas; fica a árvore; permanece; anos e anos e estações e séculos; dá mais folhas, flores e frutos, sementes, fecundidade; repete-se; e no tronco aparecem fundas rugas, em que se ocultam os deuses, feiticeiros, visionários, profetas e a eternidade; tira-se a seiva; resina; tira-se o casco, a saudade; fica a árvore; cortam flores; enfeitam jarras, usam-nas com velha arte; colhem-se os frutos e, enfim, apodrece a velha árvore; o tronco fende; as folhas caem; ficam os ramos no ar; cortam-se os ramos despidos, o vento arranca as raízes e é então que tomba a árvore.

Almeida Faria
http://www.youtube.com/watch?v=WSrY0rJELdM

domingo, 24 de junho de 2012

Sobre o prazer da poesia


Pergunta - Como definir a poesia, senhor Breton?
Resposta - A poesia é um modo de a linguagem ser infeliz. Se conheces um homem feliz conheces todos, alguém infeliz é que é único, exige investigação. Daí também a necessidade de investigares os versos do mundo, um a um, se quiseres conhecer algo, se pretenderes escrever uma Biografia ou mesmo a História Mundial de um verso.
E eis que falando vem de mim o que nunca tive. Este, um projecto que descoberto neste instante prometo fazer: a História Mundial de um Verso. Como surgiu um determinado verso, quem o trouxe, por onde andou, quem o leu, em que momentos foi dito: na voz de um homem eufórico, na voz de um homem que traiu, na voz de alguém que sofre, ou na voz de alguém que é alegre porque nasceu? Por onde andou, esse verso?
É evidente que haverá a História Nacional de um Verso e a História Mundial de um Verso, mas existirão ainda versos perfeitos que não terão história, para além de uma casa, ou mesmo para além da cabeça de um homem. Quantos versos não ficaram no pensamento que alguém deitou de imediato sobre o Mundo esquecido, como a água de um jarro para o copo? Eis o que pensa o senhor Breton, eu próprio.
A poesia começa em casa, abre a porta e atravessa a paisagem, digo ainda, o verso procura as ovelhas para do pescoço manso lhes roubar o sangue e procura o lobo para do pescoço feroz lhes roubar também sangue.  E a poesia avança de homem parado para homem parado, através da voz. Assim avança sobre a paisagem. Porque os homens são bípedes por cima da paisagem, e se assim o são devem-no aos versos, mais do que à coluna vertebral ou às pernas. O humano não é bípede porque se apoia em duas pernas, o humano é bípede porque se apoia na poesia (é o único animal que o faz). Tornou-se bípede para recitar os mitos e para que a sua voz saísse clara e alta atingindo os amigos e os mais afastados: os inimigos. Que o meu verso chegue a quem me odeia e assim ele perceba que nunca serei derrotado: porque falei. É isto que eu digo e afirmo - eu, o senhor Breton.
O homem afastou-se da estatura dos crocodilos para chamar alguém, para repetir o nome da mulher que ama. Tornou-se bípede. E o verso é isto: é uma linguagem que chama uma pessoa; uma linguagem que parece feita individualmente - como um objecto feito à mão - e oferecida também a alguém que, sozinho, a recebe. Todos os versos são privados, e a causa principal do aparecimento da poesia é a separação dos corpos, e a tristeza que no mesmo instante surgiu no mundo. É tudo o que tenho a dizer.