domingo, 28 de maio de 2023

Aberto todos os dias

O mundo
aberto lá fora. Difícil cansar-me dele. O céu
a entrar pela janela. O músculo do homem comum.
As laranjeiras de Córdova. Brindar com
água da
chuva. Os peixes do Nilo urinando na
mesma água onde nadam. O vinho que fez
um estágio nas caves do Douro
e passou. A lua a quem eu uivo a cada noite
(em segredo). Um relâmpago à janela:
electrocardiograma
de Deus. A orgia
dos seixos na espuma. Um ministro que mentiu.
Cerejas no mês de Maio. Sardinhas 
no mês 
de Junho. Os pés que saem da areia ornados 
com missangas de prata. Os enfermeiros
exaustos que saem de
mais um turno. A Vitória de Samotrácia parecendo atrasada
perguntando quelle heure est-il? à estátua da
Vénus de Milo. Jesus Cristo
num
decote. A maldade de Putin. A carne
de um dióspiro. E o
ministro não se demite. Nem um 
só dia desperdiçado. Estar à disposição do mundo. Como
quem ergue a verdade com a luva
da linguagem.

João Luís Barreto Guimarães
pintura de Edward Hopper



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