domingo, 1 de dezembro de 2013

Heróis do Mar


Coimbra, 31 de Outubro de 1993
Estamos irremediavelmente perdidos. E já ninguém o ignora e cala. É um clamor uníssono que vai do Minho ao Algarve. Um dobre a finados de uma pátria sem esperança, que o poder não ouve, ou finge não ouvir, a fazer-lhe discursos e a descerrar lápides, num desprezo olímpico pelo povo que em má hora o elegeu. Um povo que já foi senhor da sua vontade e dos seus actos, mas que muitos anos de obscurantismo, de inquisição e ditadura degradaram e perverteram, e agora, de novo tiranizado, insofrido e impotente, geme. Oiço esse gemido insistente e generalizado, e fico transido. Dói-me em todos os recessos da alma acabar os dias com ele a ressoar-me nos ouvidos atentos e solidários, confrangido de apenas poder registar o desalento de uma colectividade que se deixa sistematicamente iludir, e beija agradecida a mão de quem cinicamente, nas horas eleitorais, lhe promete o paraíso e argamassa sem pejo, em cada localidade a primeira pedra de uma escola, centro de cultura ou saúde, que nunca serão realidade. E que, depois de ser mais uma vez ludibriada, barafusta, perde a cabeça, corta estradas e interrompe o trânsito, até que a bastonadas paternais, recolhe a casa pacificamente, numa indignação envergonhada e vencida.

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