domingo, 19 de novembro de 2017

A flor



Acerca do Vesúvio poderíamos dizer alguma coisa. Ficou
no seu cume uma nuvem e o vento nem sequer a afasta. Talvez seja
uma recordação que veio ter connosco. Caminhemos
nessa direcção, porque é devagar que os nossos passos se dirigem
para o tempo. A vegetação procura o interior das cinzas.
O mar fica próximo; existe também um rio. Ao longe principiaram a cultivar
os campos. Outrora, ao descer da lava, julgo que todos estavam
adormecidos. Há quem diga que foi o sono que a trouxe,
aquecida por tantos corpos ali deitados, vasos da sua própria
nudez agora sujeita a um calor desconhecido. Que sonhos
podem existir aqui? Ficaram perdidos, dispersos pelos caminhos
sem saída de quem desperta. As mãos tocam
as chamas nelas ocultas, as fendas que se abrem mais ao encontrarmos
estas sementes iluminadas. Sempre foi igual a sombra
que as colunas deixam umas nas outras. Passamos entre elas. Talvez
uma flor calcinada conserve ainda o seu perfume.

Fernando Guimarães
https://www.youtube.com/watch?v=v9E9fv6zr18

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