sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Cruzeiro Seixas

 


Levado pelas águas

sem jamais encontrar o mar

ferozmente atacado por uma flor

olho os dinossauros idilicamente

pastando nas margens. Que vejo eu?

Já não resta fóssil sobre fóssil

e só os náufragos ainda repetem os erros de ortografia

de continente em continente.

As plumagens agitadas das palavras são estandartes

atravessando o espaço e o sono

livres em toda a sua estranhíssima glória.

São os peixes esverdeados

que escondem sob as roupagens os labirintos

e as maquinarias prontas a investir

contra o paraíso.

A experiência impregnou as pedras da sua voz rouca

e as coisas são como um tríptico aberto

mostrando aos canibais perplexos

os nós mais secretos

daquele marinheiro alado.

Desfia-se já o fio que há séculos nos mantém.

 

Tenho frio

e imploro que me cubram com o dilúvio

ao som de trombetas exacerbadas:

que me cubram a mim e ao eco,

e à memória de tudo isto.

Estou ainda aqui,

e vejo

como um cego vê o mar.


Cruzeiro Seixas

(texto e gravura)

https://www.youtube.com/watch?v=XGiEh774GBg

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