segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Gente barrosã


   Nem eu sei quando nasceu no meu espírito este amor pelos povos minúsculos, pelas repúblicas em miniatura, por todos os que vivem isolados no planeta.
   As pequenas ilhas, sobretudo, fascinam-me, porque permitem observar melhor o homem entregue a si próprio, fechado sobre si mesmo e, simultaneamente, disperso no infinito, entre mar e céu - inconsciente até do labor psíquico por ele realizado perante o eterno limite.
   É, especialmente, nas gentes que vivem entre cadeias de montanhas que vamos encontrar, de novo, o homem metido em si próprio, o homem que reduziu a vida à árdua conquista do pão quotidiano e o enigma do infinito a uma simples crença, que colocou ao canto da alma como um bordão, para dele se servir nos momentos de vicissitude ou quando a morte lhe bate à porta. Tradicionalista, página viva de antropologia, a sua atitude ante o mundo de hoje dir-se-á igual à dos seus maiores perante o mundo de ontem e de todos os dias que já se perderam no cinerário do tempo. Mas não é assim. Agora e logo, neste raciocínio, naquela fala, no desenrolar das ambições e dos intentos, descobre-se a força da evolução que o vai penetrando, hoje um pouco, amanhã mais, num trabalho lento de pua furando granito.
   Às vezes, parece-nos surpreender, nessa demorada metamorfose, algo da personalidade remota de todos nós, como se antiquíssima reminiscência faiscasse, de súbito, em sombrio recanto do nosso espírito. E surge, então, como que um sentimento de pretérita fraternidade, que se projecta no presente, abrindo-se em compreensão e amor.

Ferreira de Castro
http://www.youtube.com/watch?v=q0WBMXTUn4Q

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