quinta-feira, 12 de agosto de 2021

De Aveiro

Quem, por uma calma e luminosa manhã  de Agosto ou Setembro, deixar a cidade, seguindo a estrada da Barra - essa estrada singular, ladeada de água, com a ria por uma banda e pela outra as marinhas - e parando a meio do caminho, pelas alturas do lago do Paraíso, circunvagar em torno a vista, terá a larga visão panorâmica de uma das mais admiráveis e soberbas paisagens do nosso país. Voltando-se para a cidade, olhando por sobre os tabuleiros das marinhas, de águas paradas e polidas como placas rectangulares de vidro, vê-la- á estender-se numa linha de casaria acotovelada - traços brancos de paredes sob traços vermelhos de telhados - acima da qual se erguem perfis de torres ou altos muros de edifícios públicos e de fábricas. Depois, num segundo plano, de uma extensa gama de verdes, descobrirá os campos, os imensos milhares, as massas de arvoredo - os choupos e salgueiros que formam as cortinas marginais do Vouga, os pinheiros sombrios, os velhos álamos da estrada de Ílhavo, os tufos isolados dos esguios eucaliptos. De entre esta verdura, surgir-lhe-á a mescla branca das povoações circunvizinhas(...) E para lá, enfim,  de toda esta zona verdejante e apenas levemente ondulada, erguer-se-á ante a sua vista, no esplendor de uma imaterialização luminosa, um traço longo e caprichoso que se diria dado com uma pincelada de ametistas e safiras liquefeitas, a magnífica linha orográfica das cordilheiras da Beira: as serranias majestosas de Arouca, das Talhadas e do Caramulo, com o seu pico central e, mais para sul a avançada do Buçaco e os perfis vagos da Estrela e da Lousã, esbatendo-se diafanamente no céu de lápis-lazúli.

Luís de Magalhães (1859-1935)

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